É tudo tão verde do lado de cima do Brasil

Posted by Danúbio on sexta-feira, 30 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)





Já chove muito aqui do lado de cima do Brasil. Aquela paisagem seca, torrada que enche imagens de TV e páginas de jornais do lado de baixo do Brasil dá lugar a um verde tão intenso, tão urgente. E tudo acontece tão rápido: quando você acorda já tá tudo verdinho. Parece que o mato não deixa escapar nada da chuva. Ou deve armazenar tudo em algum depósito subterrâneo. Mas aí tudo parece tão efêmero. É um verde frágil também, a gente percebe nas folhas, nas flores: é como se tudo fosse feito de uma sêda muito delicada, que se esfarela com o toque, com o olhar até. Aí dá uma dorzinha por dentro, pois sem chuva tudo volta àquela sequidão medonha. E quem se importa? Vou ficar mesmo é olhando esse verde lindo de morrer, essas plantinhas tão pequeninas, esses brotinhos tão tenros que dá vontade de comer. E as flores sertanejas são lindas demais, é um show da Natureza, um espetáculo em plena caatinga. Enquanto o mundo acaba vou ficar aqui vivendo um verde de encher os olhos no lado de cima do Brasil.

Quando o pé doeu

Posted by Danúbio on terça-feira, 27 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (5)



Procurou naquela última gaveta do ármário da cozinha uns cigarros soltos em meio a contas pagas de água e luz. Dinho sempre lhe comprava cigarros soltos, desses de filtro amarelo. Nunca branco. Nem carteiras inteiras. Encontrou três em bom estado. Acendeu e sentou-se. Ana sempre senta-se pra fumar. Num entardecer desses de verão, Ana obrigou-se a fumar. E quando a chama do isqueiro queimou a ponta do cigarro ela soube que não mais seria assim, dessa forma tão crua a vida.
A outra subia o elevador. Trabalhava o dia inteiro numa Livraria ali perto da Presidente Vargas. Vinha a pé pra casa. Sempre. Como precisava, costumava fazer muitas coisas ao mesmo tempo, também pensava muitas coisas ao mesmo tempo e naquele exato momento em que o elevador indicava 4° Andar, ela morava no oitavo, pensava no filho que não vê há anos, na mãe que toma conta do filho em São Francisco do Sul, em como conseguiria tomar banho e se arramar pra ir pra faculdade em 37 minutos e naquela dorzinha fina, quase longe, que subia do seu dedo mínimo do pé e ia até naquele espaço onde acaba o pé e começa a perna. Pensou ainda em como diria a Ana sobre essa dor. Precisava sempre dizer coisas a Ana quando chegava: que o seu chefe é ridículo, que viu uma senhora colocar um livro de auto-ajuda na bolsa, que está pensando em visitar um amigo que não vê a muito tempo, que conheceu alguém, que havia contas pra pagar. Essas coisas vazias que enchem conversas de pessoas também vazias e de espaços também vazios, pensou.
No primeiro ar do apartamento que outra sentiu soube que agora Ana estava sentada no chão da cozinha, próxima à geladeira amarela, fumava um cigarro de filtro amarelo e bebericava um vinho desses medíocres que enchem prateleiras de supermercado, fazia o chinelo de cinzeiro e ouvia baixinho um disco dos Smith. A outra quebrou o momento quando acendeu a luz:
- A vizinha do 804 já es...
- Vou voltar. Sem tirar os olhos da chama do cigarro, Ana disse: vou voltar. Não consigo mais sobreviver a essas quatro paredes emputrecidas.
E a outra sabia que já não eram mais coisas vazias que enchem conversas de pessoas também vazias e de espaços também vazios o que Ana disse. Talvez se tivesse ido direto pra faculdade ou se tivesse se detido mais na conversa com o porteiro ou se Ana tivesse morrido enquanto ela subia o elevador, não teria ouvido a isso. Mas ela estava viva ali, sentada a seus pés, a um daqueles pés que ainda doia, querendo deixar a vida de todos os dias, com a mesma coragem e decisão que lhe falta agora.

Só pra somar

Posted by Danúbio on terça-feira, 20 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (3)



Folheando páginas de Estranhos Estrangeiros de Caio F. atrás de respostas para algumas questôes que me surgiram hoje, encontrei uma citação do convicto "pé em Portugal pé no Brasil" Miguel Torga, do 1° de seus Diários:

Pareço uma dessas árvores que se transplantam, que têm má saúde no país novo, mas que morrem se voltam à terra natal.

Some isso à última postagem. Estou melhor assim.

Pra onde ir agora?

Posted by Danúbio on segunda-feira, 19 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)



Passei quase que o dia todo com um trecho de uma música do Oasis na minha mente: I'm older than I wish to be/This town holds no more for me. Acho que preciso mesmo deixar essa cidade, pelas ruas corre uma brisa quente, podre, sutilmente podre. É necessário mais que um olfato apurado para percebê-lo. É sutil, ao contrário esta cidade estaria vazia agora. Mas não está? Vou mesmo é tirar minha mochila do fundo do armário. Parece que vamos respirar novos ares. Aqui morre-se mais fácil.
Mas tecendo as idéias em minha mente, enquanto atendia mais uma cliente enfurecida com taxas-abusivas-tarifas-indevidas, percebi que simplesmente não havia um destino, ou havia muitos, que é no fim de tudo igual a nenhum. Talvez aquela comunidade alternativa na Chapada Diamantina, talvez visitar um amigo no sul e ficar por lá até o fim do inverno, fugir pra Europa como se fosse ali do lado (tá difícil a Europa) ou pegar carona pra lugar nenhum com um desses caminhoneiros barbudos, rústicos, fedorentos, barrigudos (que tal arriscar? Excêntrico no limite). E preciso é sair mesmo daqui, fugir daqui. Tudo cada dia fica mais duro, é uma escuridão medonha. Se tivesse um quintal queimaria tudo como em O Marinheiro de Caio Fernando Abreu, mas ando fraco demais para praticar essas excêntricidades de fim-de-tarde.
p.s. A canção do Oasis se chama Rockin" Chair e está no álbum Masterplan. Ouvir: http://www.mp3tube.net/br/musics/Oasis-Rockin-chair/168481/

Preciso comprar um Aparelho de Ar Condicionado

Posted by Danúbio on domingo, 18 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (5)



Quis ficar na cama mais um pouco hoje, mas num verão desses em que termômetros marcam 38 graus facinho, facinho, foi absolutamente impossível. Quis esquecer o calor, mas quem consegue? Por aqui ele é sempre mais intenso, mais duro e era Domingo, desses de gosto amargo na boca, resultado das tentativas fracassadas de ser melhor na noite anterior, tudo misturado agora fedia na minha boca: cigarros, álcool, beijos, e suores de outros corpos e cheiros também. E meu estômago não aguenta mais, pediu socorro ontem (uma puta dor), mas, coitado, apenas recebeu e processou mais uma dose. Qualquer dia desses morro.
Seria mais conveniente ficar o dia todo de molho, esquecer essas coisas de dores e feridas e amores, essas coisas que como o suor brotam da cabeça e invadem todos os cômodos da minha "humilde choupana".
Definitivamente preciso comprar um ar condicionado.

Ainda há traços

Posted by Danúbio on , under | Estiveram aqui... (2)



Pode me negar à vontade.
Vontade
Vontade
Vontade de viver
Vontade

Você já ficou sozinho?
Você chora?
Você sofre?
Você se apaga?
Você dói?

Tenho alguém agora.

Você chora?

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