Um ano radioativo

Posted by Danúbio on terça-feira, 29 de dezembro de 2009 , under | Estiveram aqui... (0)



Para minha humilde vida, da forma mais particular possível, esse ano não foi fácil mesmo.
Quero tratá-lo como lixo radioativo, desses que ficam imersos a centenas de metros de profundidade e que contaminam ao menor contato.

A Invasão do Bispo

Posted by Danúbio on terça-feira, 22 de dezembro de 2009 , under | Estiveram aqui... (0)



Nos últimos dias tenho sido violado, ou melhor, isso soou horrível, tenho sido incomodado pela programação matinal da rede Record de uma forma um tanto peculiar. Como costumo varar a noite escrevendo ou cochilando em frente a tv, meu sono costuma ir até meio-dia. Naturalmente tudo se altera no meu Fabuloso Relógio Biológico. Geralmente tomo café pra depois de dez minutos almoçar, isso tem me rendido quilos extras, muitos quilos extras. Voltando
Como meu sono não é tão profundo pela manhã e minha mãe é a melhor expectadora do bispo, e isso se mede pela altura do volume  da TV, costumeiramente as personagens desse exemplar-canal-de-televisão, como já diziam os evangélicos, invadem meus sonhos, se misturam a eles. Bom que já acordo bem informado dos acontecimentos, entretanto, fica feia a coisa quando começa o Hoje em Dia, programa apresentado por mais de um cento de pessoas que vai das 9 da manhã até nem sei. Além das receitas que faço ao lado de meu amigo Edu Guedes, dou broncas exemplares nos demitidos do reality show do canal, que passam a semana pintando por lá. Hoje mesmo, bati boca com Xuxa, ex-nadador brasileiro, pela sua péssima atuação na Fazenda. Vou pedir a direção do programa que meu nome seja inserido nos créditos da programação e ao bispo pedirei pela minha inclusão na sua Fabulosa Folha De Pagamento. Afinal, sonhos são ainda propriedade privada.

A paixão de Elisa

Posted by Danúbio on segunda-feira, 21 de dezembro de 2009 , under | Estiveram aqui... (0)



Seus sinais. Foi por eles que me apaixonei primeiro, especialmente um que carrega no rosto, quase nulo, perdido na palidez de sua pele e que some completamente quando ri aquele meio sorriso de quem sabe sofrer. E de todas os outros que se derramam por suas costas e pernas e pés.
Depois me apaixonei pelo seu cheiro, pelo cheiro quente e sujo de seu quarto e lençóis e edredom. pelo suor dos fins de tarde, pelos talos de grama presos ao seu pescoço.
Depois me apaixonei pela sua fome incontrolável, pela forma como esvaziava minha geladeira e esfolava meios armários à procura de comida.
Depois me apaixonei pela sua voz rouca, cheia de notas estranhas, de indecisão, a mesma de quem começa a esquecer da infância para viver as intensidades da juventude. Pelo barulho de seu sorriso e de como precisava sempre sorrir fosse das desgraças dos outros ou de sua própria.
Depois me apaixonei pelos seus pais, pelos seus irmãos e irmãs, pelos cômodos de sua casa, pela sala e cozinha e quartos.
Depois me apaixonei pela sua falta vazia e mortal, pela sua presença de sonhos e sorrisos.
Quando decidi me apaixonar por você já nem mais existia, nem eu nem você.

Nunca acreditei que pudesse piorar

Posted by Danúbio on , under | Estiveram aqui... (0)



As noites de Natal, por incrível que possa parecer, sempre foram de solidão, dessas faltas físicas mesmo. De pessoas de carne e osso. Sempre tive muitos amigos, não posso reclamar, mas na noite de Natal desapareciam todos. As ceias eram pra ser partilhadas em família, e eram rígidos com isso, só parentes. Nada de pessoas de fora, fossem os melhores amigos. Mesmo que no outro dia amanhecessem em meu portão pra contar dos porres que foram testemunhas ou protagonistas, dos presentes, dos tios alcoólatras, das tias sapatões.
Minha companhia nunca passou de duas ou três garrafas de vinhos, um pedaço de provolone roubado, uma carteira de cigarros Marlboro e Elis se rasgando bem baixinho no som, uma chuva fina e constante que varava a noite e o quarto escuro, que completava a cena. Ali mesmo bebia, chorava e dormia pra acordar ferido de manhã. Tenho motivos legítimos pra desgostar dessa data.
Nunca acreditei que pudesse piorar.
Nesse natal nem vinhos nem queijos, não tenho de quem ganhá-los ou de onde roubá-los. Elis se perdeu na mão de algum vizinho cruel não acostumado a devolver cd´s. Sem quarto escuro também, e apesar do calor que faz aqui, sei que nem a chuva virá. Será mesmo uma noite de cerveja e cigarros. E o pior: não estarão lá, de manhã, no outro dia, batendo no meu portão pra contar dos porres que foram testemunhas ou protagonistas, dos presentes, dos tios alcoólatras, das tias sapatões.

O epitáfio de um sapato velho

Posted by Danúbio on quinta-feira, 8 de outubro de 2009 , under | Estiveram aqui... (0)



As pessoas dizem que sentem quando vão morrer; não sei se com sapatos funciona da mesma forma. Já faz alguns dias que tenho percebido isso: o fim. Nem tanto pelos buracos no solado ou as rachaduras no couro ou o cadarço esfarrapado, mas meu dono tem se afastado de mim. Do mais querido do armário fui trocado por um mocassim zero quilometro, desses que chegam a cegar de tanto brilho.
Dessa forma, antes de ser abandonado num canto de parede sujo e frio e começar a ser consumido por fungos impiedosos, preciso que saibam de mim, que fui um sapato espetacular, feito com um couro italiano finíssimo, o principal motivo de uma vida longa e saudável. Tenho primos chineses que não vivem nem dois meses. Garanti conforto e maciez aos pés de meu dono; entretanto, nunca fui muito recompensado por isso, pelo contrário, literalmente andei por caminhos tortuosos: lama, calçadas escaldantes e toda sorte de sujeiras que prefiro nem citar e, meu Deus! Me digam quem inventou o tal do chiclete? Os humanos têm câncer, nós temos chicletes, a maior praga que foi inventada. Também tenho trauma mortal de dias chuvosos e de fumantes. Meu dono é um desses e me usa para apagar pontas de cigarros. Poderia odiá-lo por isso, mas quer saber? Minha vida foi chocante, dessas que dariam facilmente um romance ou um conto, por isso o quero tanto. Ah! Tenho um irmão gêmeo. Ele é carrancudo, de poucas palavras. Ainda não absorveu a dura realidade. Está inconformado com a vida, não suporta que tenha sido largado e já anda arquitetando planos para tornar um inferno a vida do novo mocassim. Eu não, estou em paz, tranquilo. E, antes que a podridão me tome, que meu epitáfio seja: Amou cada passo de sua vida.

Eu volto. Um dia eu volto.

Posted by Danúbio on sexta-feira, 24 de julho de 2009 , under | Estiveram aqui... (2)




Diálogo

Posted by Danúbio on segunda-feira, 8 de junho de 2009 , under | Estiveram aqui... (5)



-Você me ama?
-Essa batata tá horrível!
-Você me ama?
-Como?
-Você me ama?
-Amo
-Quanto?
-Desse tantão, como faz um menino, e tu?
-Eu o quê?
-Tu me ama?
-Amo
-Quanto?
-Desse tantinho, mas por que ninguém pode saber?
-Por que não.

Jimi

Posted by Danúbio on segunda-feira, 11 de maio de 2009 , under | Estiveram aqui... (1)



Para
Marcelo Santos
Carlos Alesander e
Bruno Baungartner,
que me matam
sempre que podem.
"Oh! Jimi
O tempo passou
E a gente não viu
Oh! Jimi
Aonde você foi agora?
Oh! Jimi
Dez anos
E o que a gente construiu?
Oh!
A banda, o futebol
oh! Jimi
O tempo passou e a gente sorriu
Oh! Jimi
Você não está aqui agora
Pra onde você foi, não sei, faz frio?
Tem sexo ou é vazio?
Da correnteza ao rio?
Ou uma luz?"
Duca Leindecker
Cidadão Quem

A Boca da Escuridão

Posted by Danúbio on sexta-feira, 8 de maio de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)





Tenho evitado não me contaminar. Tenho evitado ouvir, atender portas e receber telefonemas. Já não leio mais jornais.
Me envolvi demais.
Dores demais.
Ressentimentos demais.
Barbitúricos demais.
Às vezes faço viagens breves pelo meu corpo, braços, pernas, estômago, por dentro. Conheço
cada artéria,
cada vazo,
cada célula.
Mas tem uma janela que vejo no alto. Chamei-a de A Boca da Escuridão. Vagam através dela tudo aquilo que sou eu e não conheço, corre por elas todas as
palavras que evito,
feridas que evito,
lembranças que evito.
As pessoas sempre me empurram para essa janela, e mesmo que eu me rasgue, me esperneie, me dilacere, ainda assim me empurram. Mas estou
fraco demais,
à flor da pele demais,
ausente demais.
Não suportaria abrí-la. Então os evito todos, mesmo os mais indispensáveis. Para não me contaminar não atendo portas nem telefonemas.

Dos deuses

Posted by Danúbio on quinta-feira, 7 de maio de 2009 , under | Estiveram aqui... (6)




Quando se ama tanto, mas tanto alguém, esse alguém se endeusa, se torna algo sublime, imaculado.

E só me ocorreu agora: quanto mais nos aproximamos dos nossos deuses mais humanos esses se tornam, mais crus e cruéis se mostram, capazes de atos tão impiedosos que nem nós humanos-mortais seríamos capazes de cometer. Aí o brilho apaga. São tantas coisas cuspidas na cara, tantos pecados cometidos, tanta frieza gratuita.

Bom mesmo é ficar o mais distante possível. Olhar sempre pro alto quando lembrar deles, - ando fazendo isso demais - não passar mais que uma tarde ao seu lado, ou alguns minutos no MSN, mas nunca dias inteiros, nem semanas inteiras. E nunca, absolutamente nunca, dormir com eles.

Prozac e Ressentimentos

Posted by Danúbio on quarta-feira, 6 de maio de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)




Respostas

Posted by Danúbio on sexta-feira, 17 de abril de 2009 , under | Estiveram aqui... (6)



Quem disse que é tão fácil a vida real? Quem disse que no dia-a-dia as coisas acontecem como nos filmes ou nas novelas? Tudo é mais duro aqui fora, mais cru e nada, absolutamente nada é do jeito que a gente queria que fosse, principalmente o outro, aquele mesmo que a gente mais ama, a não ser que nos apaixonemos por um robõ e programemos ele para fazer o que mais a gente deseja, mas aí seria fácil demais, seria cômodo demais. Acho que tudo que passamos nessa vida, com os outros, pelos outros ou sozinhos mesmo nos torna mais fortes, mais toleráveis, e é hora de aprender novas lições, dessas que a vida ensina na chibata, à pulso. E sabe de uma coisa? já chegou a hora de ler nas entrelinhas, nos olhares, não espere palavras doces ou diretas, claras, essa são as que mais confundem, não espere gestos, eles seriam grosseiros. As mãos são duras e ásperas, mas os olhares, os olhares são diferentes, não enganam nem cegos. Agora é hora mesmo de aprender. A vida real, essa mesma que pulsa pra fora das janelas, das portas, essa mesma que grita sua crueldade em todas as esquinas dessas ruas esquecidas. Rasgue seus romances, todos esses que inebriam seus desejos. Viva e veja. Abra os olhos.

Para loucos apenas

Posted by Danúbio on quarta-feira, 15 de abril de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)



Já sabia. Depois de 17 anos amargando rancores num sanatório compreende. Mas aos 13 não entendeu muito bem por que sua avó decidiu levá-la ao psiquiatra. São pra doidos, pensou, desses que rasgam dinheiro, que correm pelados pelas ruas. Ela não, se muito, pôs fogo na cama da vizinha, frustrada pelas tentativas de participar das brincadeiras de rua com as outras meninas do bairro. Tinha mania de jogar chaves no esgoto, todas que encontrasse, das portas de casas, de carros, de armários. Mas psiquiatras não cuidam de meninas que jogam chaves no esgoto ou pôe fogo na cama das vizinhas por vingança. De loucos apenas, desses que espumam pela boca, como cachorros raivosos. Que há de mal ficar em casa, comer cabelos, cortar o calcanhar com a lãmina do aparelho de barbear do irmão mais velho ou sufocar o gato com a almofada do sofá. Não entendeu mesmo. Que há de mal em se queimar com a chama da vela ou com a cera quente que ela chora. Era tão boa a sensação, como quando cortava a cabeça das bonecas e as pendurava na laranjeira do quintal. Psiquiatras não são pra acabar com o prazer que as pessoas sentem, só a loucura.
Hoje não, mas aos treze compreendeu: psiquiatras curam os loucos, não meninas que cortam a garganta de suas avós enquanto elas dormem.

Conheci um Kurt

Posted by Danúbio on quinta-feira, 9 de abril de 2009 , under | Estiveram aqui... (3)




Entre Kurt e eu sempre houve uma conexão, mais que Astrológica, de compreensão, independente de o que foi ele como RockStar (nunca lhe coube esse título mesmo, nem são essas palavras de mais um fâ esquizofrenico e frustrado pela sua ida). Além dos refletores e dos estúdios conheci um Kurt às vezes homem, às vezes menino, de olhos sempre marejados, de sorrisos rígidos e amigos sinceros. Nada consigo mais dizer e sei que nunca, nem se quisesse, nem num bilhão de palavras e gestos saberia te dizer o que penso e o que sinto sobre ele. E nunca, principalmente, seria capaz de julgar nenhum de seus atos, até o mais extremo. Sempre houveram razões. Elas sempre existem.
Conheci mesmo. Conheci um Kurt de calças apertadas, sapatos gastos, tocando um velho violão numa velha garagem de lugar nenhum, num chuvoso e frio 20 de agosto.

Quando colho os girassóis

Posted by Danúbio on sexta-feira, 3 de abril de 2009 , under | Estiveram aqui... (8)




Para Eulália, que
me iluminou com girassóis

Tenho andado por caminhos tão cinzentos, irregulares, cheios de poças de lama apodrecida, de buracos causados pela erosão das chuvas. Passam por mim invisíveis, todos. Também ando por ruas de pedra, dessas centenárias, mal iluminadas, com nevoeiros que quando cortam a luz formam fantasmas dóceis, desejáveis. Traço retas que não percorro, bamboleio, caio. Cruzo esquinas com cachorros famintos, derrubando latas, rasgando sacos de lixos, e uma podridão se espalha. Também passo por campos infinitos de girassóis, desses grandes, redondos perfeitos, caprichados. Ai os colho, aos montes, pois mesmo que por poucos os dias que durem, serão minha luz quando essa faltar, serão meu guia quando minha cabeça cambalear pelo peso dos anos, serão enfim, minhas lembranças, todas essas doces, quentes, infinitas.

A Volta

Posted by Danúbio on quinta-feira, 26 de março de 2009 , under | Estiveram aqui... (8)



Agora a pouco fiquei imaginando no que diria quando voltasse. Que fiz uma viagem, que fiquei doente ou um parente meu havia morrido, mas não, eu só estava aqui, quieto, parado. Vivendo de restos: de pessoas. Mas as pessoas também se acabam.
Eulália, eu sempre quis te chamar de Eulália, posso então? Me perdoe o silêncio. Ira, estou garimpando seus livros por sebos de Juazeiro, meus amigos estão todos envolvidos na procura, são difíceis. Adri, (pausa) penso em todas as coisas que perdi. Quando se mora tão londe perde-se um show do Radiohead. Um beijo. Mikaelle, como faço? Teu cheiro ainda não saiu de mim. Santiago, como pode me conhecer tão bem? À sua maneira. E você do abrigo: ainda choro.

O Carnaval já acabou?

Posted by Danúbio on quinta-feira, 5 de março de 2009 , under | Estiveram aqui... (6)



Me envolvi tanto com o Carnaval
que só ontem fui perceber que
não era Quarta-feira de Cinzas.


Não gosto de Carnaval mesmo, só aproveitei esses dias pra me afastar um pouco de tudo. Aos que sentiram minha falta: Biba, Ira e Adri, vocês são insuperavelmente excepicionais. Já tava na hora de voltar, né?

Hoje, a maior falta é (...) Do seu canto

Posted by Danúbio on sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (8)



"Hoje, a maior falta
é da sua voz. Do seu
canto. Do seu sorriso.
Do seu jeito de me fazer rir,
mesmo quando a vontade
é de chorar. A falta é do teu
barulho e a tristeza é
pelo teu silêncio."

Fagner Damaceno

Amanheceu o Dia

Posted by Danúbio on , under | Estiveram aqui... (4)



O sol rasgou logo
cedo a manhã, e
foi cinza tudo,
morno, parado.
Senti falta
de um café
bem quentinho,
de um abraço
apertado e de um
choro no ombro. Carlinhos,
quando vocè chora suas
lágrimas não tocam seu rosto.
Me diz Carlinhos, por quê?

Eram duas redes apenas

Posted by Danúbio on terça-feira, 17 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (14)



Eram duas apenas. Naquela casa enorme, daquela cidade, só havia duas redes armadas. Redes de punhos espessos, de tramas grosseiras, cheirando ainda a algodão cru, lavado uma única vez. Não havia nada mais dentro de casa.
Eram dois apenas. Perdidos entre incertezas do futuro, sonhos realizados, outros tantos jogados. Eram jovens moços. Recém tirados do útero. Não sabiam de dores, nem de lágrimas, nem de escuro. Mas já temiam os outros daquela cidade, poucos sorrisos, poucos iguais. Olhares espantados escondidos entre cortinas de salas ainda desconhecidas. Testas franzidas mostradas a olho nu, sem pudor, sem medo de ferir.
Passavam tardes escaldantes se balançando naquelas redes, falando de tempos de quando nem se conheciam, de amores de outras cidades, de amigos de outras cidades, falando de tempos que ainda viriam. E já se desejavam. E pra não se olharem miravam fundo nas telhas a sua frente, acima, refletindo vermelho um sol que cozinhava tudo lá fora. E já se amavam. E para não se tocarem, cantavam músicas, muitas, todas essas que enchem a cabeça de jovens moços.
Mas duas redes era pouco para suas vidas, que começava a crescer lentamente. Trocaram as redes por camas primeiro. Aí veio uma TV, uma geladeira, fogão. Um rádio. E já não se desejavam, nem olhavam perdidos para o telhado. A TV era ainda mais atraente. E já não se amavam, nem cantavam músicas que enchem a cabeça de jovens moços. Era mais fácil apenas ouvi-las no rádio.
As redes foram esquecidas, jogadas num quartinho pequeno, mofavam silenciosas, chorosas em seu esquecimento.
Ainda quiseram, juro que sim, quiseram queimar tudo e resgatar piedosos as redes no quartinho, mas já não havia coragem. Havia medo. Apenas o medo de não se resistirem.

Das veias

Posted by Danúbio on domingo, 15 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (11)



I'm safe
Up high
Nothing can touch me
But why do I feel this party's over?
Max Martin
Das veias. É das veias que gosto mais. Aquelas azuis, cheias que histórias e de noites mal-dormidas. Cheias de feridas que sangram quando o inverno chega. Veias grossas, desesperadas por um fio. É das veias que gosto mais.

Manhãs de Verão aos pés da Chapada do Araripe

Posted by Danúbio on sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (6)














































imagens: João Eudes
Queria partilhar com vocês essas imagens fabulosas aqui do pé da serra na Chapada do Araripe. A gente roda tanto o mundo a procura de tesouros tão incertos que se esquece, ou finge não notar, que os presentes mais magníficos Deus os coloca a nossa porta. Um ótimo fim de semana pra todos vocês. Passem bem.
Abraços e beijos

A Maldição Dela

Posted by Danúbio on quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (8)



Achou que fosse uma maldição. Não por ter perdido a visão aos 4 anos, sempre conviveu muito bem com isso. Passarinhos mortos: foi a última cena que se lembra ter visto antes de tudo ficar escuro, de seus olhos se apagarem. No começo ainda notava vultos esbranquiçados dos outros de sua casa. Do sol, da Lua e outras coisas corriqueiras que conheceu quando podia ver. Ela sabia muito pouco. Sua imaginação era pequena, resumia-se a um sofá, cadeiras, uma boneca de pano, um rio e passarinhos mortos. Se tivesse que contar uma história esses seriam seus personagens.
E então tudo foi ficando cada vez mais escuro, as coisas que via perdiam o contorno e se misturavam ao escuro do cenário de sua visão. E com o passar dos anos também deixou de ouvir. Um a um dos outros de sua casa. Sua mãe, só ontem deixou de ouví-la. Talvez todos tenham ficado mudos. Aos 71 anos ela pensou: era mesmo uma maldição.

A dez dias do febril 20 De Fevereiro

Posted by Danúbio on terça-feira, 10 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (17)



Nunca compreendi muito o motivo de tantas pessoas comemorarem seus aniversários. Os meus, meu Deus!, foram sempre dias terríveis, medonhos, chôchos, sem luz. Também não entendo muito esse meu bode com esse tipo de comemoração (direto para o Analista). Ainda assim, aviso pros amigos, coloco no Orkut, jogo verde, mas é de dentro pra fora sabe: quando chega o dia é aquela coisa branca, parada, um vácuo só. Pra mim dia 20 é só o aniversário de Kurt Cobain e da minha vizinha, nunca o meu. E ai vêm os famosos MUITOS ANOS DE VIDA, QUE VOCÊ SEJA MUITO FELIZ e o impagável FELIZ ANIVERSÁRIO. aí você fica com aquela cara de tonto, tremendo o lábio, desesperado por uma lágrima, para mostrar que está emocionado e tal, mas a danada num vem. Acho que você só fica mais velho, mais sozinho, mais próximo do fim. Será que vou ter que pagar pelas minhas companhias? Será possível? 26 anos. Jesus, alguém rebobine a fita! Preciso recomeçar. Sei que não sobreviverei a Síndrome dos 27. Recomeçar já estaria de bom tamanho: em outro emprego, outras pessoas, em outro lugar. Pode ser aqui ou no Japão (será que me aceitariam no Japão?) Jovem brasileiro procura desesperadamente orientais de ambos os sexos e de qualquer idade para relacionamento amoroso e possível casório(é desespero mesmo). É sério agora: nesse aniversário vou me presentear com um novo começo. Novas possibilidades de me tornar melhor, menos vunérável a tantas futilidades. E tenho ainda dez dias pra planejar esse presente. Mãos à obra!

Não consigo terminar este conto

Posted by Danúbio on sábado, 7 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (7)



A idéia desse conto surgiu às três da manhã dessa madrugada, na garupa de uma motocicleta com alguns miligramas de álcool correndo em minhas veias. Precisei desesperadamente voltar, antes que ela me fugisse como tantas outras que se perderam. Sinto que as possibilidades com essa são maiores. Me vieram apenas o início, o fim e ospersonagens. Me falta o meio. Tenho medo dele, talvez por ainda estar se formando aqui dentro e eu não saber o quanto ele pode ser comprometedor ou mesmo pelo que pode representar para esse meu momento. Ainda assim, vamos a ele.


Se sentou no batente da cozinha e esperou. Já passava das cinco da tarde quando acendeu um cigarro e notou que no horizonte se formava um temporal desses que lavam tudo: casas, carros, ruas, homens, pessoas. Havia ainda roupas no varal no seu quintal grande de cidade pequena e um gato que brincava com algo que ela não conseguia enxergar, seus óculos estavam em cima da TV da cozinha e a mesma vontade que não tinha para apanhar as roupas do varal era e de não pegar seus óculos. Quis apenas esperar, talvez Leonardo pudesse estar perdido com alguma bobagem de esquina, uma conversa com colegas ou uma passada rápida na casa daquele seu amigo gordo. É Rodrigo o nome dele, pensou. Não sabia o motivo, mas desse tal de Rodrigo tinha ciúmes. Leonardo sempre sorri quando está com ele. Eu conheço bem os dois.
Eram exatamente cinco e dessesete no relógio da sala quando um garoto de dessesete anos, mochila nas costas e All Star nos pés apontou na esquina da padaria, era ele enfim. Notou sua camiseta molhada próximo a gola e nas axilas. Estava suado, podia, pois lembrou-se que nas sextas davam aulas de Educação Física na escola. Imaginou que cheiro poderia ser o dele. Já esteve com outros adolescentes de desseseis anos no tempo em que lecionava, mas não conseguia se lembrar. Já faz muito tempo. Talvez pudesse ser bem intenso. A mistura de todas as secreções daquele corpo poderiam resultar em uma poção quase que hipnótica. O cheiro é sempre o que fica. Quis sentí-lo, mas nem o vento que rondava poucas folhas no quintal trouxe outro cheiro além de o da chuva que se aproximava.
Ela era uma bela mulher branca. Apesar de seus quarenta e dois anos, apresentava ainda em suas carnes uma rigidez atraente. Tinha curvas que se acentuavam quando colocava aqueles vestidos de algodão, que quando contra a luz era possível ver o contorno de suas coxas e o volume de sua vagina. Eram linhas simétricas, perfeitas. Qualquer um daqueles garotos que passava nos fundos de seu quintal teria a mesma opinião. Era sutilmente ruiva, de olhos castanhos e lábios finos. Unhas feitas religiosamente às quartas depois do almoço, com dois cigarros e um café no intervalo entre as unhas das mãos e dos pés.
(...)
Agora já podia entrar, começava a chover. Esqueceu as roupas e o gato. Entrou. Acendeu mais um cigarro e a luz da cozinha. preparou velas para o caso de faltar energia. Era um temporal aquele. Pegou na geladeira cenouras e batatas.
- Vou fazer uma sopa.

E tudo é tão simples

Posted by Danúbio on quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)



Nem sei como começar, nem sei também o que e como dizer em palavras que façam vocês compreenderem, é necessária a experiência, mas vamos então: ontem, cansado dessa "vidinha" de cidade e TV e internet e noitadas larguei tudo e subi a serra, é um refúgio que tenho, poderia ser um lar, mas depois de tudo isso não consigo mais voltar a viver coisas simples, preciso de coisas grandes e intensas, mesmo que firam e doam. É um lugar impressionante, pessoas, amigos, águas, coisas: tudo emite algo que me deixa melhor, que me faz reviver coisas do tempo em que não tinha nada, em que podia tudo, por que meu tudo era muito pouco.
E me vi no fim do dia num barzinho absolutamente rústico, uma luzinha fraca no teto de telhas tão antigas quanto a História, de paredes de barro rebocadas a mão, com amigos do meu tempo em que era simples, tomando cerveja, fumando um cigarro paraguaio e falando de coisas e de tempos e de bobagens (Marcelo, vocè sabe do que estou falando, ja viveu essa experiência comigo). E eu me senti tão completo, tão pleno, tão normal, que só parei quando já nem podia mais contar quantas cervejas tinhamos bebido.
Então, eu só queria dizer que no meio daquela escuridão, vivenciando coisas grandes com pessoas que vivem com tão pouco eu me senti tão melhor, tão mais Ser e percebi algo que está claro, a gente sabe disso, mas que parece que nem quer ver (me perdoem o clichê): é tão bom viver coisas simples, sem dia-a-dia, sem dores, sem podridão, sem amargura. As vezes penso que tudo seria melhor se nem tivesse deixado minha casa pra viver essas coisas todas aí de fora: pessoas, livros , histórias, desejos e também sei, com amargor (existe essa palavra?) que não há mais volta, que nunca mais poderei viver aqui sabendo que o mundo é tão vasto, tão cheio de possibilidades e de pessoas que poderão me fazer feliz, ou ao menos menos doente ou triste. Eu só queria dizer isso.
P.S. E a todos que conheci quando deixei minha casa (por ordem cronológica e por representarem algo pra mim): Patrick, Mateus, Fabiomar, Francisco, Cris, Jonece, Dinho, Iraildo, José Augusto, Raimundo, Mary, Marcos, Biba, Zeli, Andressa, Marcelo, Carlinhos, Bruno Shiranga, Ísis, Vanessa, Leandro, Geordanne, Bruno, Elisa, Gleiciano, , quero dizer que amo muito vocês todos, valeu por tudo que a gente viveu juntos e aprendeu juntos, mas são parte dessa dor que sinto, talvez por estarem longe, ou por saber que alguns de vocês nunca mais verei. Nunca os esqueço.

É tudo tão verde do lado de cima do Brasil

Posted by Danúbio on sexta-feira, 30 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)





Já chove muito aqui do lado de cima do Brasil. Aquela paisagem seca, torrada que enche imagens de TV e páginas de jornais do lado de baixo do Brasil dá lugar a um verde tão intenso, tão urgente. E tudo acontece tão rápido: quando você acorda já tá tudo verdinho. Parece que o mato não deixa escapar nada da chuva. Ou deve armazenar tudo em algum depósito subterrâneo. Mas aí tudo parece tão efêmero. É um verde frágil também, a gente percebe nas folhas, nas flores: é como se tudo fosse feito de uma sêda muito delicada, que se esfarela com o toque, com o olhar até. Aí dá uma dorzinha por dentro, pois sem chuva tudo volta àquela sequidão medonha. E quem se importa? Vou ficar mesmo é olhando esse verde lindo de morrer, essas plantinhas tão pequeninas, esses brotinhos tão tenros que dá vontade de comer. E as flores sertanejas são lindas demais, é um show da Natureza, um espetáculo em plena caatinga. Enquanto o mundo acaba vou ficar aqui vivendo um verde de encher os olhos no lado de cima do Brasil.

Quando o pé doeu

Posted by Danúbio on terça-feira, 27 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (5)



Procurou naquela última gaveta do ármário da cozinha uns cigarros soltos em meio a contas pagas de água e luz. Dinho sempre lhe comprava cigarros soltos, desses de filtro amarelo. Nunca branco. Nem carteiras inteiras. Encontrou três em bom estado. Acendeu e sentou-se. Ana sempre senta-se pra fumar. Num entardecer desses de verão, Ana obrigou-se a fumar. E quando a chama do isqueiro queimou a ponta do cigarro ela soube que não mais seria assim, dessa forma tão crua a vida.
A outra subia o elevador. Trabalhava o dia inteiro numa Livraria ali perto da Presidente Vargas. Vinha a pé pra casa. Sempre. Como precisava, costumava fazer muitas coisas ao mesmo tempo, também pensava muitas coisas ao mesmo tempo e naquele exato momento em que o elevador indicava 4° Andar, ela morava no oitavo, pensava no filho que não vê há anos, na mãe que toma conta do filho em São Francisco do Sul, em como conseguiria tomar banho e se arramar pra ir pra faculdade em 37 minutos e naquela dorzinha fina, quase longe, que subia do seu dedo mínimo do pé e ia até naquele espaço onde acaba o pé e começa a perna. Pensou ainda em como diria a Ana sobre essa dor. Precisava sempre dizer coisas a Ana quando chegava: que o seu chefe é ridículo, que viu uma senhora colocar um livro de auto-ajuda na bolsa, que está pensando em visitar um amigo que não vê a muito tempo, que conheceu alguém, que havia contas pra pagar. Essas coisas vazias que enchem conversas de pessoas também vazias e de espaços também vazios, pensou.
No primeiro ar do apartamento que outra sentiu soube que agora Ana estava sentada no chão da cozinha, próxima à geladeira amarela, fumava um cigarro de filtro amarelo e bebericava um vinho desses medíocres que enchem prateleiras de supermercado, fazia o chinelo de cinzeiro e ouvia baixinho um disco dos Smith. A outra quebrou o momento quando acendeu a luz:
- A vizinha do 804 já es...
- Vou voltar. Sem tirar os olhos da chama do cigarro, Ana disse: vou voltar. Não consigo mais sobreviver a essas quatro paredes emputrecidas.
E a outra sabia que já não eram mais coisas vazias que enchem conversas de pessoas também vazias e de espaços também vazios o que Ana disse. Talvez se tivesse ido direto pra faculdade ou se tivesse se detido mais na conversa com o porteiro ou se Ana tivesse morrido enquanto ela subia o elevador, não teria ouvido a isso. Mas ela estava viva ali, sentada a seus pés, a um daqueles pés que ainda doia, querendo deixar a vida de todos os dias, com a mesma coragem e decisão que lhe falta agora.

Só pra somar

Posted by Danúbio on terça-feira, 20 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (3)



Folheando páginas de Estranhos Estrangeiros de Caio F. atrás de respostas para algumas questôes que me surgiram hoje, encontrei uma citação do convicto "pé em Portugal pé no Brasil" Miguel Torga, do 1° de seus Diários:

Pareço uma dessas árvores que se transplantam, que têm má saúde no país novo, mas que morrem se voltam à terra natal.

Some isso à última postagem. Estou melhor assim.

Pra onde ir agora?

Posted by Danúbio on segunda-feira, 19 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (4)



Passei quase que o dia todo com um trecho de uma música do Oasis na minha mente: I'm older than I wish to be/This town holds no more for me. Acho que preciso mesmo deixar essa cidade, pelas ruas corre uma brisa quente, podre, sutilmente podre. É necessário mais que um olfato apurado para percebê-lo. É sutil, ao contrário esta cidade estaria vazia agora. Mas não está? Vou mesmo é tirar minha mochila do fundo do armário. Parece que vamos respirar novos ares. Aqui morre-se mais fácil.
Mas tecendo as idéias em minha mente, enquanto atendia mais uma cliente enfurecida com taxas-abusivas-tarifas-indevidas, percebi que simplesmente não havia um destino, ou havia muitos, que é no fim de tudo igual a nenhum. Talvez aquela comunidade alternativa na Chapada Diamantina, talvez visitar um amigo no sul e ficar por lá até o fim do inverno, fugir pra Europa como se fosse ali do lado (tá difícil a Europa) ou pegar carona pra lugar nenhum com um desses caminhoneiros barbudos, rústicos, fedorentos, barrigudos (que tal arriscar? Excêntrico no limite). E preciso é sair mesmo daqui, fugir daqui. Tudo cada dia fica mais duro, é uma escuridão medonha. Se tivesse um quintal queimaria tudo como em O Marinheiro de Caio Fernando Abreu, mas ando fraco demais para praticar essas excêntricidades de fim-de-tarde.
p.s. A canção do Oasis se chama Rockin" Chair e está no álbum Masterplan. Ouvir: http://www.mp3tube.net/br/musics/Oasis-Rockin-chair/168481/

Preciso comprar um Aparelho de Ar Condicionado

Posted by Danúbio on domingo, 18 de janeiro de 2009 , under | Estiveram aqui... (5)



Quis ficar na cama mais um pouco hoje, mas num verão desses em que termômetros marcam 38 graus facinho, facinho, foi absolutamente impossível. Quis esquecer o calor, mas quem consegue? Por aqui ele é sempre mais intenso, mais duro e era Domingo, desses de gosto amargo na boca, resultado das tentativas fracassadas de ser melhor na noite anterior, tudo misturado agora fedia na minha boca: cigarros, álcool, beijos, e suores de outros corpos e cheiros também. E meu estômago não aguenta mais, pediu socorro ontem (uma puta dor), mas, coitado, apenas recebeu e processou mais uma dose. Qualquer dia desses morro.
Seria mais conveniente ficar o dia todo de molho, esquecer essas coisas de dores e feridas e amores, essas coisas que como o suor brotam da cabeça e invadem todos os cômodos da minha "humilde choupana".
Definitivamente preciso comprar um ar condicionado.

Ainda há traços

Posted by Danúbio on , under | Estiveram aqui... (2)



Pode me negar à vontade.
Vontade
Vontade
Vontade de viver
Vontade

Você já ficou sozinho?
Você chora?
Você sofre?
Você se apaga?
Você dói?

Tenho alguém agora.

Você chora?

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